quarta-feira, 6 de fevereiro de 2008

O MEDIATO E O IMEDIATO

Há países que admitem o aborto. De nossa parte, só em dois casos. Primeiro, se ele for necessário para salvar a vida da gestante. Segundo, se a gravidez resultar de estupro e, neste caso, há que ter autorização da mãe.
Depois que o óvulo feminino tiver sido fecundado pelo espermatozóide, já temos o ser humano. Isso, até quanto sei, é científico e se assim é, não temos o direito de matá-lo. Tem de ser gestado e parido, porque é uma vida e a vida é valor supremo na religião e na Constituição.
Em todos os carnavais, há polêmica neste país. Uma grita danada de alguns setores da Igreja, contra o uso dos contraceptivos. Uma coisa por demais. Não consigo mesmo entender porque tanto preconceito contra as pílulas anticoncepcionais e outros métodos preventivos de gravidez.
Setores radicais, de vezo escolástico, ortodoxo e leguléio, escracham os recursos que evitam a gravidez. Vou morrer e não vou entender a razão dessa gente. Essa visão arcaica e vetustamente contraditória, me preocupa. Parece que preferem o risco da gravidez impensada e irresponsável ao direito de planejar o nascimento programado e consciente do ser humano. Saibam que, quando se evita a gravidez, evita-se a formação irresponsável da gravidez e não há falar em aborto.
Creio em Deus, tenho religião e procuro segui-la. Sei que sou cheio de defeitos e de imperfeições. Quanto sou! Pode ser que, por conta disso, procuro e não consigo entender as razões dos que combatem os recursos anticoncepcionais. Sempre fui e, cada vez mais, fico contra eles nesse campo. Aprendi que essa questão não é dogma religioso. É questão de saúde pública e de política social.
Me desculpem. Dizem defender a vida quando não tem vida em jogo. Não procedem de má fé, mas é preciso lembrar que, usando anticoncepcionais, evita-se que um ser vivo seja gerado sem responsabilidade. Daí resulta que estão certos aqueles que distribuem camisinhas e outros badulaques que evitem gravidezes e mais gravidezes irresponsáveis. Se são pagos com dinheiro público, visam objetivo nobre que é assegurar menos menores abandonados, menos excluídos e, lá adiante, menos criminosos.
Se alguém disser que é preciso educar para o sexo responsável, digo que concordo. Agora, esperar que a multidão que gosta da folia e que coalha as ruas, avenidas e salões da festa do rei Momo, fique responsável e seguidora dos princípios religiosos, não dá. Enquanto não tivermos essa boa educação de nossa gente foliã e enquanto houver perigo de sexo irresponsável, camisinhas vão evitar o pior.
O ideal é mediato e está a longo prazo. Virá depois que nossa gente toda tiver-se inteirado de princípios de vida. A necessidade de evitar os males do sexo irresponsável, é imediata. Nem as nossas religiões e nem o Estado têm conseguido preparar nossa gente para o ideal. Nessa linha de raciocínio, é preciso ter em conta que, às vezes, é preciso mesmo dar o peixe, para só depois ensinar a pescar. Acho que me fiz entender. A questão é de sopesar o mediato e o imediato.
(Eliseu Auth é Promotor de Justiça inativo, atualmente Advogado militante).

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